"As lagartas viram borboletas""E o que são borboletas?""São flores que voam!", Petit PrinceO António tem mais de sessenta anos.
Os olhos azuis aguados, a inteligência apurada, o humor trocista, o charme que a maturidade trouxe.
Foi à guerra quando o país exigiu, perdeu a propriedade da família quando o país quis e a nacionalizou.
Com trinta e poucos anos era comandante, posto supremo a que aspiram os pilotos de avião. Namorador, conquistador.
Em criança voava até à lua num avião de papel.
Só voou, toda a vida, desde os tempos dos aviões de papel até hoje.
Foi só o que quis fazer, mas teve que ir à guerra, teve que casar, teve que ter filhos, é o que fazem todas as pessoas, é o que a vida quer que as pessoas façam...
Divorciou-se quando as mulheres (duas) quiseram.
Quando a vida quis, e ele ainda não tinha quarenta anos, um acidente amarrou-o a uma cadeira de rodas.
E ele continuou a voar.
O António não foi à lua, mas deu duas vezes a volta ao mundo, a pilotar sozinho o seu próprio avião. Já paralítico.
O António é um herói a sério.
Disse-me hoje que está pronto para, finalmente, ir à lua num avião de papel.
Vou rezar para não chover nesse dia. O António merece ter o direito de, uma vez na vida, ser ele a querer. Tem o direito de querer e de fazer.
E eu, mesmo que tenha esse direito, não vou chorar.
Escrevi este post em 17 de Março deste ano. O António não chegou a ter tempo de fazer um último vôo escolhido, o vôo definitivo. Num dia de muita chuva, no princípio deste mês, faleceu discretamente, aos 64 anos. Ninguém soube. Para quem quiser saber mais sobre este herói internacionalmente reconhecido, ele tinha um site com um nome que diz tudo: As asas da teimosia.Adeus, António. Lamento que tenha chovido.